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Kefera, lugar de fala e o feminismo

No dia 13 de dezembro, uma das convidadas do programa “Encontro”, da apresentadora Fátima Bernardes, foi a youtuber e atriz Kefera. Junto com ela, estava também a escritora Heloisa Buarque de Holanda. Em dado momento do programa, o microfone foi aberto para perguntas da plateia e um rapaz decidiu relatar um ocorrido para dizer que não concordava com algumas posturas das feministas. E foi então que Kefera disse que o rapaz estava praticando mansplaining e manterrupting, ao mesmo tempo que não tinha lugar de fala para dizer o que estava dizendo.

Manterrupting e mansplaining são termos empregados para caracterizar posturas conversacionais masculinas frente a mulheres, seja interrompendo a fala ou esclarecendo algo que é já sabido da mulher que participa da interação.

Esse breve relato já dá pano para a manga por vários motivos: primeiro, porque muitas pessoas têm um entendimento bastante equivocado do que sejam os feminismos. Generalizam, assumem que é tudo uma coisa só, que se resume a ataque aos homens e pelos embaixo do braço. Segundo porque para responder a isso, a entitulada feminista disse que a opinião do rapaz era desnecessária, o que abriu margem para que muitas pessoas dissessem que esse é o posicionamento das minorias, que não há diálogo, não há conversa.

No diálogo do programa, não houve, no entanto, mansplaining ou manterrupting. O rapaz queria dar um exemplo para mostrar o que ele não achava saudável de uma interação com uma mulher, que ele dizia feminista. Como ele sabia que a mulher era feminista são outros quinhentos. Nem isso ficou claro, nem Kefera conseguiu responder à dúvida do rapaz: um corte traz Fatima Bernardes para o palco novamente e essa interação se dá por encerrada.

Para falar sobre o ocorrido de maneira mais alongada, gravei o vídeo abaixo.

Me preocupa a maneira como usamos termos de maneira equivocada ou pouco aprofundada. Muitos debates interessantes acontecem na internet, mas também tem muito papo de orelhada, de gente que ouviu alguma coisa em algum lugar e, pluft, sai proclamando aos quatro ventos ideias tortas, confusas, pouco embasadas.

E para trazer uma perspectiva embasada para a conversa, sugiro aqui o livro da Djamila Ribeiro, O que é lugar de fala?, o artigo da filósofa Linda Alcoff e outro da professora indiana Gayatri Spivak. Esses textos são possibilidades de leitura sobre a questão do lugar de fala, que poderão nos tirar do entendimento comum – e equivocado – de que lugar de fala implica em exclusividade de fala, ou seja, se eu falo, somente eu posso falar. Como a propria Djamila revela em seu livro:

“Assim, entendemos que todas as pessoas possuem lugares de fala, pois estamos falando de localização social. E, a partir disso, é possível debater e refletir criticamente sobre os mais variados temas presentes na sociedade. O fundamental é que indivíduos pertencentes ao grupo social privilegiado em termos de locus social consigam enxergar as hierarquias produzidas a partir desse lugar e como esse lugar impacta diretamente na constituição dos lugares de grupos subalternizados.”.

Sejamos a reflexão na internet. Não a disseminação de entendimentos rasos sobre os diferentes assuntos.

Vamos nessa?